Uma conversa matinal.



- Bom dia minha pequena, o que está aprontando ai?

Ela me respondeu com uma cara convidativa de 'vamos fazer nada juntas'.

Era bem cedo, pouco mais de quatro da manhã. O dia estava despertando junto comigo e os primeiros raios de luz rasgavam o céu num espetáculo que merecia ser admirado, ali, fazendo absolutamente nada, mas junto com ela.

Não costumo acordar tão cedo, não mesmo. Despertei-me pela falta, pois a pequena e aconchegante presença não estava sob meus pés como era de costume em todos os sonos, para todos os sonhos... fui procurá-la então, estava na varanda, admirada com o dia, apenas isso, 'sublimamente' nisso.

- Sabe Suzy, são tempos difíceis. As coisas estão alucinantes em sua rapidez e intensidade. Os problemas não tem dado trégua e tudo, absolutamente tudo, quer me pôr a prova, como um teste de fé...

Ainda concentrada no horizonte, ela suspirou com pesar, sabia o que estava por vir...Comecei a me emocionar no discurso e com um embargo na voz, disse-lhe:

- E bem... tem você! Minha fortaleza mais genuína,  a vitalidade e alegria pros dias de luta, o aconchego dos choros, a compreensão para os estouros, tem você precisando de mim quando mais preciso de você! Mas que droga...

Lágrimas rolaram pelo rosto, ela estava lá para secá-las, como sempre.

- Não é justo que o pedaço mais saudável de mim esteja doente... nesse tempo doente. Não e justo que eu não possa ser para você agora, nem metade do que você é para mim desde sempre...

Seu olhar fixou em um ponto da paisagem e eu fiquei ali admirando-a em sua irracionalidade tão sábia. 

Ela envelheceu, é fato. Tem uma expressão já cansada, embora sua pouca idade aponte ao contrário. Seu corpo mudou e suas feições (sim, feições) já apresentam rugas da idade, o peso da saúde em dificuldades... Contudo, ainda tem aquela expressão leve que me trás tanta paz e que (puta merda!) eu quero e preciso demais, por muito tempo ainda, para sempre se possível! 

(...) Voltei a me emocionar, seria loucura - se pudesse - partilhar parte da minha vitalidade para mantê-la viva, apenas uma cachorra? apenas um animal? Uma amiga de uma vida! Uma filha, parente... Desviei o foco, olhei para o ponto que seu olhar fixou, tentando fugir das lágrimas (eu preciso ser forte para ela...) e entender o que prendera tanto sua atenção.

- Ué Suzy, é só uma estrela. Não é?

Seu olhar, por um segundo, veio de encontro ao meu "você não percebe nada não é mesmo?" e voltou fixo a tal estrela. Entendi eu acho...

- Estrelas não aparecem durante o dia afinal (...) e poxa, como ela se destaca entre esses raios de luz que estão reluzindo...

Admirei-me também. Entendi sua atenção para aquela estrela, era a fé que eu precisava. O sinal absoluto que tudo sobrevive de um jeito ou de outro e continua reluzindo, mesmo quando encoberto por nuvens, mesmo sob a intensidade de outros focos de luz... lembrei de na infância, quando minha madrinha faleceu, meu pai contar-me sobre o modo que ela virou estrela ("a maior e mais brilhante do céu") só para zelar por mim, só para estar lá todas as noites...

- Você acha que animais também viram estrelas Suzy? 

Abracei-a, deixei que nosso silêncio respondesse por nós e que os sentimentos bons que temos uma pela outra, curassem o medo, aconchegassem o coração, nos fizesse adormecer mais uma vez para novamente compartilharmos sonhos e a doce sensação da presença uma da outra.


*P.S: Suzy Tufo terá de se submeter a uma cirurgia aparentemente simples, ainda assim, o coração aperta e a paz de espirito desestabiliza-se numa proporção indizível... eu adoraria que ela virasse estrela um dia, só que agora e por mais alguns muitos anos (se Deus permitir) eu adoraria que ela permanecesse aqui... como não posso escolher, rezo apenas para que seja o melhor para ela, incondicionalmente. *

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Nosso visto K1,

Beijar a flor e provar o fel... ou o mel.

Dois mil e OUSE.